5.9.06

Deslizamento de taludes em áreas urbanas

O Brasil passou por muitas transformações ao longo do século passado. O país passou de uma economia essencialmente agrária para uma economia industrial. A população migrou do campo para a cidade à medida que novas oportunidades de trabalho surgiam nas cidades e no campo era introduzido a mecanização do processo de cultivo e colheita.

Mas esse processo não se desenvolveu de forma ordenada e planejada, ocasionando diversos problemas em relação ao uso e ocupação do solo. As cidades médias e especialmente as grandes experimentaram a ocupação de áreas de encostas e mananciais por pessoas sem recursos e alternativa de moradia. A população ali devidamente instalada modificou as características originais do relevo da região, expondo essas áreas ao risco de deslizamentos de massas de terra.

Esse processo de ocupação deveu-se por diversas razões. Dentre elas podemos citar os problemas de urbanização das cidades, especialmente da cidade de São Paulo, que não conseguiu conter o seu inchamento e a expansão de construções na periferia e em áreas de risco. Outros fatores preponderantes são o processo político, que por diversas razões não conseguiu minimizar o processo de exclusão social, os fatores econômicos, que modificaram o padrão de vida e comportamento da população ao longo do tempo e a migração provocada pelo ingresso da massa de trabalhadores saindo do campo e ingressando nas cidades em busca de novas oportunidades de trabalho que se abriam.

Urbanização
As favelas constituem-se na alternativa possível de moradia para parcela importante da população das grandes cidades brasileiras. São áreas deixadas para trás no processo de crescimento da cidade, muitas vezes por apresentarem condições desfavoráveis para a ocupação. constituíram-se em terrenos onde os processos naturais da dinâmica do meio físico desenvolvem-se de forma mais intensa. (Carvalho, 1997)

Em decorrência dessas ocupações irregulares, também verificadas em áreas de manancial, de proteção ambiental, e de encostas e morros, a cidade experimentou um crescimento desordenado. Hoje existe uma enorme carência em infra-estrutura de saneamento básico, energia elétrica, telecomunicações, transportes, coleta de lixo. Com tantos problemas a prefeitura não tem condições de investir o dinheiro necessário nessas obras. Alguns serviços foram transferidos para a iniciativa privada e outros terceirizados, mas ainda assim o problema continua grave.
A prefeitura hoje conta com recursos escassos que são pulverizados em diversas áreas. A rede de esgotos do município ainda não atingiu muitos bairros, que são obrigados a resolver o problema individualmente com a construção de fossas sépticas ou ainda lançando o esgoto a céu aberto ou em córregos e rios próximos. Em áreas de risco o lançamento de esgoto in natura no solo além de contaminar o solo e o lençol freático, acaba contribuindo para que ocorram deslizamentos de terra.
Outro problema é o recolhimento de lixo que em certas regiões periféricas da cidade inexiste ou acontece de forma esporádica e aleatória. Com isso as pessoas acabam jogando o lixo em rios e córregos ou morro abaixo. Isso acaba contribuindo para deslizamentos ocorrerem.
Com poucos recursos em caixa, a vigilância e acompanhamento de encostas em áreas de risco fica comprometida. A construção de barreiras de contenção para solucionar o problema torna-se muito pequena quando comparado com o total de regiões com potencial risco de solapamento e desestabilização.

Migração

A migração para os grandes centros urbanos vindas de outras regiões para São Paulo acabou provocando um crescimento desordenado da cidade. Algumas pessoas vieram trazendo dentro de si a esperança de melhores condições de vida, o sonho de um trabalho decente e uma vida melhor. Acabaram esbarrando com um mercado que não conseguiu absorver esse enorme contingente de pessoas. Muitas acabaram se instalando em regiões periféricas, morros e encostas irregularmente, sem as mínimas garantias de segurança.
As ocupações em áreas de risco de deslizamentos trouxeram um grave problema para a prefeitura que não conseguiu atender satisfatoriamente a todas essas regiões com uma infra-estrutura básica. A fiscalização dessas áreas tornou-se difícil. Atualmente no município de São Paulo existem mais de mil regiões catalogadas consideradas como áreas de risco.

Como visto, a ocupação irregular, especialmente em São Paulo tomou uma proporção incontrolável. Suas conseqüências podem ser vistas diariamente em noticiários ou notados como no caso da poluição e contaminação de córregos , rios e mananciais da cidade.
No caso das ocupações irregulares em encostas, o fenômeno de desenvolvimento desordenado é arcado por edificações construídas sem os mínimos critérios de segurança, o esgoto corre a céu aberto, onde crianças são vistas brincando nas redondezas, submetidas a todo o tipo de infecções e doenças venéreas. As ligações de luz e telefone são feitas clandestinamente, sendo realizadas através de “gatos” na rede pública. O acúmulo de lixo acaba agravando o problema de contaminações e infecções. A limpeza pública raramente é vista recolhendo o lixo acumulado. Como conseqüência disso temos um aumento da fragilidade do solo, que acaba se tornando alvo fácil das intempéries, ocorrendo o colapso e deslizamento do solo. Essa realidade provoca outro problema que são os casos de soterramento de casas e famílias.

Em terrenos com baixa resistência à erosão, sem infra estrutura de sistemas de drenagem e de pavimentação das ruas, tiveram, inicialmente, sua ruas sulcadas por ravinas, devido à concentração do escoamento superficial das águas pluviais e, não raramente, se transformaram em boçorocas de grande porte. Os núcleos urbanos mais antigos, normalmente se localizavam distantes dos talvergues estáveis, o que dificultava a extensão dos lançamentos finais dos sistemas de drenagem urbana, devido ao alto custo dos emissários, poços de visita e dissipadores de energia hidráulica, propiciando o desenvolvimento de boçorocas pelo reentalhamento remontante. (Fendrich, 1997)
Medidas preventivas acabam tornando-se inócuas devido ao engessamento do poder público, ao reduzido número de fiscais e ao corporativismo e clientelismo dos funcionários da prefeitura. O pequeno número de fiscais para controlar e reprimir as ocupações e construções irregulares acaba servindo de incentivo para a atuação de pessoa de má fé em busca do lucro fácil à custa do resto da população. Alguns fiscais não conseguem realizar seu trabalho devido a atuação de criminosos que impedem o seu livre acesso a região.
Com o agravamento da crise de emprego e a queda de renda da população, um grande
número de pessoas migraram para as regiões periféricas da cidade em busca de moradias mais baratas. Mas com a mudança vieram os problemas como a falta ou insuficiência de transporte coletivo, irregularidades no fornecimento de água, inexistência de rede de esgotos. Aliado a todos esses fatores temos as construções irregulares em encostas sem os mínimos critérios técnicos e de segurança. Somado a tudo isso ainda temos uma malogra coleta de lixo.

Em decorrência desses fatores as áreas ocupadas em encostas tornam-se potencialmente vulneráveis ao risco de deslizamentos de terra. Os principais agentes responsáveis por esse problema são climáticos, as águas de superfície e subsuperfície, as características geomorfológicas e de distribuição dos materiais que compõem o substrato das encostas, as construções sem planejamento e o lixo acumulado nessas áreas.

Características climáticas
Os climas tropical e subtropical impõem características próprias aos processos de intemperismo. Como resultado típico tem-se mantos de cobertura superficial de grandes espessuras, com formação de zonas de diferentes resistências, permeabilidades e outras características que se relacionam diretamente com os mecanismos de escorregamentos e processos correlatos. (Augusto Filho, 1993)

Regime das águas de superfície e subsuperfície
Deve-se determinar o curso d’água preferencial na superfície provocados pela ação das chuvas. O curso do esgoto lançado “in natura” em certas regiões irá misturar-se com o curso d’água. É importante determinar o local de deságua desses cursos d’água. O comportamento das águas subsuperficiais também é um fator importante no comportamento das camadas de solo superficiais e imediatamente abaixo da superfície das encostas. O represamento das águas subsuperficiais resultante de impermeabilizações na base das encostas podem ocasionar um represamento do fluxo de água, resultando em uma elevação do nível d’água e das pressões neutras tendo como conseqüência a deflagração de escorregamentos. Os principais mecanismos de atuação das águas de subsuperficie no desencademento dos escorregamentos são a diminuição da coesão aparente, variação do nível piezométrico em massas homogêneas e elevação da coluna d’água em descontinuidades. A contaminação das águas de superfície e subsuperfície devido ao acumulo de lixo e a falta de rede de esgotos é um fator agravante do mecanismo de movimentação de massas de terra.(Augusto Filho,1993).

Acumulo de lixo
O problema do acumulo de lixo nas encostas devido a falta de coleta acaba fazendo com que os moradores joguem o lixo na própria encosta, nos rios e córregos próximos. Como conseqüência temos a proliferação de moscas e outros insetos e a multiplicação de ratos. Também nota-se um odor desagradável. A decomposição da matéria orgânica produz chorume que provoca a contaminação do solo e lenço freático. Em resposta temos um solo frágil e vulnerável, que não consegue resistir a ação das chuvas.
De outro lado, por ser um material sem coesão e de alta porosidade, o lixo atinge rapidamente alto grau de saturação e excessivo aumento de peso, o que normalmente causa seu escorregamento, podendo ou não comprometer a parte superficial do terreno. O problema pode se agravar quando o lixo é descarregado em local que recebe o lançamento de águas servidas e em linhas de drenagem naturais. Afora o problema da instabilidade, depósitos de lixo são sempre uma ameaça à saúde da população. O impasse pode ser resolvido com a remoção do lixo e escolha de locais adequados para seu depósito, bem como implantação ou otimização de sua coleta e transporte. (Cunha, 1991)

Em função de todos os fatores expostos, pode-se notar que todos os problemas relacionados às ocupações irregulares em encostas vem a resultar numa fragilidade e vulnerabilidade do solo, provocando erosões, o seu colapso e finalmente o deslizamento de massas de terra.

Como forma de combater esses problemas, a defesa civil do estado de São Paulo preparou um plano preventivo para ocorrências no litoral paulista como apresentado abaixo.O PPDC - Plano Preventivo de Defesa Civil - é operado em 4 níveis, sendo prvistas para cada nível determinadas ações:
Observação
Acompanhamento dos índices pluviométricos
Atenção
Vistoria de campo nas áreas de risco anteriormente identificadas
Alerta
Remoção preventiva da população das áreas de risco iminente, indicadas pelas vistorias
Alerta Máximo
Remoção de toda a população que habita áreas de risco
(Yoshikawa, 2000)
Por fim, frise-se que, de acordo com a Defesa Civil, a prefeitura pode controlar e planejar as ocupações em encostas através de medidas como :
· Elaborar o Plano Diretor de Desenvolvimento Municipal, onde serão identificadas as áreas de risco e estabelecidas as regras de assentamento da população. Pela Constituição Federal (art.138) esse Plano é obrigatório para municípios com mais de20 mil habitantes.
· Promover a participação efetiva das lideranças comunitárias, das associações e dos cidadãos, em ações preventivas para aumentar a segurança global da população.
· Fiscalizar as áreas de risco, evitando o assentamento perigoso em morros e encostas.
· Aplicar multas, quando o morador não atender as recomendações da Prefeitura.
· Elaborar um plano de evacuação com um sistema de alarme. Todo morador deve saber o que fazer e como fazer para não ser atingido.
· Implantar o esgotamento de águas servidas e a coleta do lixo domiciliar.
· Indicar quais áreas estão seguras para a construção.